A Judite de Sousa e eu (I)
Nunca tive nem grande lata nem grande tarimba para a graxa. Sempre que por mote próprio ou por uma qualquer imperatividade tenho que abordar amigos ou quem quer que seja com as manigâncias do elogio, a mansidão saí-me falsa e corada, como se tivesse acabado de impingir, com uma palmadinha nas costas, um falso testemunho ao próprio Deus omnipotente.
Uma vez por outra, e sempre por culpa e estupidez própria, escorrego na imbecilidade de me julgar um Don Juan do elogio e o piropo graxista sai escanzelado e pouco convincente, sempre atracado a um derradeiro sorrisinho incapaz e arrogante. Foi o que aconteceu com a Judite de Sousa.
Maio é, em Coimbra, um mês do diabo para se torrar dinheiro. O primeiro desvio pecaminoso é sempre o do arraial do delírio que é a Queima das Fitas.
Ainda hoje ninguém me consegue demover da ideia de que a existir um purgatório, ele é igual à Queima das Fitas de Coimbra, sem lâbaras de fogo e emanações de enxofre, mas com os sapatões do traje a afundar-se na lama, camaradas etílicos vestidos de batman e tipas
(a quem a cerveja domou a vergonha)
a mijar de côcoras junto ào rio.
O segundo planeta da conjugação da despesa na brisa sorrateira de Maio maduro armava-se de lona, de aluminio, de rebites e parafusos no coração da Praça da Républica, iam as calendas do mês nos seus meandros.
A tenda, que não era dada a circos, a palhaços pobres ou ricos que fossem, a leões escanzelados ou a senhoras de farripa no queixo, não deixava, ainda assim de merecer a localização central que ocupava no âmago da cidade.
Abrigava, primeiro, de uma virada os novos valores da literatura nacional, ladeados pela indiferença que se começava a votar aos valores de sempre, novas e velhas edições, os best-sellers e os que vendiam não tão bem. Depois, durante um período mais parco, os livros davam lugar a esteiras de Montemor, a presépios toscos onde a virgens se assemelhavam a matrioskas russas e a pirilaus das Caldas feitos canecas e jarras e pisa-papéis
(tomates descomunais impedindo o papel vegetal de planar janela fora)
na penumbra de cartazes de plástico onde a autarquia se definia a si mesma como paladina da defesa não só da alma, como da gente.
De forma que em Maio a Praça era para mim um pouso costumeiro, grave era a noite em que por esta ou outra ou est’outra razão não deambulava entre os saramagos e os lobo antunes, a abanar a cabeça em desmazelo pelo numero redondo de edições da nova futriquice das rebelo pinto e a remoer para comigo em sinopses breves de megalomania que num desses anos vindouros
(quanto mais envelheço mais me apercebo do quinhão de futuro que deixei para trás)
também sentaria o cu numa cadeira de vime, abaulada e intermitente em estalidos e gorgeios, com uma planície propilénica e alva pela frente, três ou quatro volumes encavalitados, insuflando um cheiro morno a celulose a um canto do tampo da mesa, uma esferografica inoxcrom
(a caneta do profissional)
a aviar, como se um doutor de estigmas literários se tratasse, assinaturas em jeito de receituário no reverso da capa do tal volume não escrito e não-inscrito, uma mão cheia de criaturas buítreas à espera de um julgamento avisado,
(“para a pequena eneida, que este livro possa conduzir a novas navegações”)
a desfazerem-se em louvores ao pragmatismo da escrita antes mesmo de folheadas as primeiras páginas e de debulhados os humores das personagens e a concluirem de lábio retorcido, como se houvessem escutado as palavras a um papagaio,
- Muito bonita a sua escrita, senhor gonçalo
ou
- Fenomenal, senhor luís peixoto
e eu, ao mesmo tempo, contente e arrabiado por lamber como melaço o mérito por livros que não escrevi e fulo das entranhas por me terem baptizado de novo com nomes outros que não o meu, a mastigar para mim mesmo, ainda que em sinopses breves de megalomania, que razão têm os velhos
(mais vale foder um “home”, do que lhe trocar o nome)
Uma vez por outra, e sempre por culpa e estupidez própria, escorrego na imbecilidade de me julgar um Don Juan do elogio e o piropo graxista sai escanzelado e pouco convincente, sempre atracado a um derradeiro sorrisinho incapaz e arrogante. Foi o que aconteceu com a Judite de Sousa.
Maio é, em Coimbra, um mês do diabo para se torrar dinheiro. O primeiro desvio pecaminoso é sempre o do arraial do delírio que é a Queima das Fitas.
Ainda hoje ninguém me consegue demover da ideia de que a existir um purgatório, ele é igual à Queima das Fitas de Coimbra, sem lâbaras de fogo e emanações de enxofre, mas com os sapatões do traje a afundar-se na lama, camaradas etílicos vestidos de batman e tipas
(a quem a cerveja domou a vergonha)
a mijar de côcoras junto ào rio.
O segundo planeta da conjugação da despesa na brisa sorrateira de Maio maduro armava-se de lona, de aluminio, de rebites e parafusos no coração da Praça da Républica, iam as calendas do mês nos seus meandros.
A tenda, que não era dada a circos, a palhaços pobres ou ricos que fossem, a leões escanzelados ou a senhoras de farripa no queixo, não deixava, ainda assim de merecer a localização central que ocupava no âmago da cidade.
Abrigava, primeiro, de uma virada os novos valores da literatura nacional, ladeados pela indiferença que se começava a votar aos valores de sempre, novas e velhas edições, os best-sellers e os que vendiam não tão bem. Depois, durante um período mais parco, os livros davam lugar a esteiras de Montemor, a presépios toscos onde a virgens se assemelhavam a matrioskas russas e a pirilaus das Caldas feitos canecas e jarras e pisa-papéis
(tomates descomunais impedindo o papel vegetal de planar janela fora)
na penumbra de cartazes de plástico onde a autarquia se definia a si mesma como paladina da defesa não só da alma, como da gente.
De forma que em Maio a Praça era para mim um pouso costumeiro, grave era a noite em que por esta ou outra ou est’outra razão não deambulava entre os saramagos e os lobo antunes, a abanar a cabeça em desmazelo pelo numero redondo de edições da nova futriquice das rebelo pinto e a remoer para comigo em sinopses breves de megalomania que num desses anos vindouros
(quanto mais envelheço mais me apercebo do quinhão de futuro que deixei para trás)
também sentaria o cu numa cadeira de vime, abaulada e intermitente em estalidos e gorgeios, com uma planície propilénica e alva pela frente, três ou quatro volumes encavalitados, insuflando um cheiro morno a celulose a um canto do tampo da mesa, uma esferografica inoxcrom
(a caneta do profissional)
a aviar, como se um doutor de estigmas literários se tratasse, assinaturas em jeito de receituário no reverso da capa do tal volume não escrito e não-inscrito, uma mão cheia de criaturas buítreas à espera de um julgamento avisado,
(“para a pequena eneida, que este livro possa conduzir a novas navegações”)
a desfazerem-se em louvores ao pragmatismo da escrita antes mesmo de folheadas as primeiras páginas e de debulhados os humores das personagens e a concluirem de lábio retorcido, como se houvessem escutado as palavras a um papagaio,
- Muito bonita a sua escrita, senhor gonçalo
ou
- Fenomenal, senhor luís peixoto
e eu, ao mesmo tempo, contente e arrabiado por lamber como melaço o mérito por livros que não escrevi e fulo das entranhas por me terem baptizado de novo com nomes outros que não o meu, a mastigar para mim mesmo, ainda que em sinopses breves de megalomania, que razão têm os velhos
(mais vale foder um “home”, do que lhe trocar o nome)
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home