O regresso da chuva
Respingando dos beirais nas horas mortas da madrugada, a chuva tem como que alma própria, é a companhia serena do primeiro sono, embala tanto como o mar calmo.Subtraída a essa circunstância, a chuva – branda ou forte – é quase sempre incómoda pela impressão que suscita, pelo alagado que causa, pela indisposição em que mergulha o espírito. Se diurna, batendo nas vidraças, é uma prisão líquida que obriga aos entrefolhos do lar, que conduz ao usufruto imposto da modorra que aniquila.
Cai desde ontem com toada certa e com uma macieza insuspeita e reconforta vê-la tombar esparsa mas insistente, com a benesse de um milagre e a suavidade de um suspiro aliviado. Percebo, enfim, a ampla quadratura do amor telúrico. No verde pálido que ganha de novo cor de saúde, na água nascida da pedra e na pedra feita há um equilíbrio em retoma, um traço de normalidade que fazia falta. Sorri de novo a Terra, e eu, escondido por trás da vidraça, não posso estar senão feliz.
3 Comments:
Tens razão!
Não gosto de chuva mas mesmo assim, vi em mim algo que já não via há bastante tempo. Há quem lhe chame renascer...
Já reparaste que é raro ver alguém nestes dias de guarda-chuva (ou chapéu de chuva, como dizem os da capital) ??
Lluvia, lluvia, lluvia...
Numa altura em que se fala tanto da escassez da água e em que o Homem tenta controlar a Natureza provocando chuva, chego mesmo a pensar se não será um milagre as gotinhas que caiem do céu...
Já fazia falta! Quanto mais não seja para lavar a alma...
C.
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