sexta-feira, setembro 28, 2007

Os que falam ...


São Tomé e Príncipe é um dos países mais inóspitos do mundo. Duas ilhas e uns quantos ilhéus luxuriantes, moldados num caldo morno de isolamento e de esquecimento. Quem por lá passou fala de um tempo outro, de uma tranquilidade inaudita e de uma espécie de degradação maravilhosa. Aos são tomenses que se decidem pela permanência sobre o fogo do Equador pouco mais sobra que a imaginação e que um manto de um verde que esmaga.
Há uns anos parece que por lá encontraram petróleo. A avidez pelo ouro negro fez com que pela primeira vez em muitos anos o mundo olhasse para o arquipélago e desenterrasse do mapa o semblante das duas ilhas.
Os dois territórios terão sido, porventura, os últimos quinhões do feudalismo medieval português. Fora do mundo e fora de tempo, no São Tomé das roças e da malária, a miséria substituiu a escravatura e durante anos o que restou foi um povo a olhar o mar por querer partir.
Frágil, pobre, pequeno na sua pequenez, o país não soçobrou. Mitigou o isolamento e foi fazendo o que pode, com uma ou outra ajuda. Ontem, Fradique de Menezes cuspiu na realpolitik e, mostrou na 62a Assembleia Geral da ONU, que os amigos não se apunhalam.

terça-feira, setembro 18, 2007

Duas no código, uma na ferradura


A 1 de Outubro próximo entra em vigor o novo regime do Código da Estrada.
A formalidade passa-me ao lado. Não é que a ignore ou que as lides de um dos códigos legislativos com maior incidência nos trâmites do quotidiano me sejam desinteressantes. A razão é outra, simples e óbvia: não conduzo e o governo decidiu legislar para os que conduzem, aceleram e estacionam.
Eu, que não conduzo, não acelero e não estaciono, fico de novo votado a uma penumbra que, convenhamos, me incomoda.
A partir de 1 de Outubro há um novo Código da Estrada em vigor e, tal qual o antigo, os que não conduzem e - como eu - se limitam a atravessar a estrada, ficam de novo sem saber quais são afinal os seus direitos e as suas obrigações.
Quando estudava na universidade foi-me dito que havia signos, símbolos e objectos que tinham, por si mesmos, valor linguístico e uma performance própria: o fumo, por exemplo, deveria ser lido como um indício da existência de fogo. Uma passadeira no coração de uma estrada como uma evidência de uma espécie de refúgio.
Não é necessário ter-se noções de semiótica para se respeitar uma passadeira. Todos aprendemos desde pequeninos que a "zebra" é o local que nos leva ao outro lado da rua em segurança.
Segurança que em Macau não existe porque existir ou não existir passadeira pouca diferença faz. É um ofício perigoso, quase um mister à Indiana Jones, este de se atravessar a rua até ao outro lado.
O ano passado, ali à frente do Pacapio, uma velhinha (daquelas quase sumidas, enrugadas como os trapos) foi abalroada à minha frente. Seguia em pleno coração da passadeira. O choque não foi violento, mas a senhora ficou estatelada ao comprido com uma dúzia de mirones a inteirar-se da tragédia.
Do carro, com matrícula dupla, saiu um fulano que me pareceu menos chocado que impaciente. Gesticulava e cuspitava palavras que me pareceram assanhadas, apontando a unhaca à velhaca ali estendida. Tem alguma coisa que atravessar passadeiras, diabo da velha!
Contive-me para não lhe ir ao focinho: dois passos mais e tinha sido eu.
À frente do Pacapio não há semáforos: a zebra zurra por si só e é quem mais ordena. Perdão! Estamos em Macau: a zebra é quem mais devia ordenar. Nunca o fez e pelos vistos não o virá a fazer tão cedo.
A 1 de Outubro próximo, o novo código da estrada entra em vigor. Vou ver ainda se até lá arranjo um exemplar, com as coimas, as mudanças e as alterações todinhas.
Pode ser que venha a dar jeito da próxima vez que eu me borrar todo quando a velhinha à minha frente for apanhada por um carro mesmo mesmo no coração da passadeira.

sexta-feira, setembro 07, 2007

Esta semana fez anos...


... provavelmente a voz mais plural de Macau.