quinta-feira, julho 05, 2007

Mitologia Grega


Carson Yeung Ka Shing é um dos fulanos mais ricos de Hong Kong. É dono da quarta casa mais cara de toda a Asia e é, desde a semana passada, também o accionista maioritário do Birmingham.
O Birmingham está para o futebol inglês como a Académica está para o futebol português: são clubes do nem ata nem desata, da margem inferior da tabela.
Yeung Ka Shing não é, ainda assim, muito afoito a negócios perdedores e perdulários. O fulano terá conseguido grande parte da fortuna pessoal através do investimento feito no sector do jogo, em Macau, nomeadamente no casino Greek Mythology.
O Greek Mythology é um dos casinos mais lucrativos de Macau e é também uma das instâncias da antiga Cidade do Nome de Deus que mais me recordam Portugal.
Não sei se não será freudiano: as figuras de estuque que enfeitam a entrada e as entranhas do casino - divindades levemente fulminadas pelo quadratura kitsch que domina a "coisa"- têm um não sei que de folia carnavalesca, lembram um Correia de Campos feito cabeçudo, a tergiversar os lados todos à rua ao som dos bombos dos zés pereira.
São assim umas estátuas gigantones, muito esdrúxulas e imperfeitas, aquelas que enfeitam o casino do senhor Yeung Ka Shung. Um Zeus de esferovite à entrada com uns cavalos que não se sabe muito bem se estão a erguer-se das àguas, se estão a morrer afogados.
A tudo isto assistem umas ninfas encovadas, quase em posição fecal, de quem se prepara para arrear o calhau à velocidade da luz.
Lá por dentro há frescos de filósofos à mistura com centuriões romanos, capitéis dóricos e jónicos feitos de gesso e contraplacado, tudo muito leviano e ligeiro, longe de um certo requinte que existe já por outros casinos de Macau. E no entanto, este Greek Mythology é um dos casinos mais visitados da RAEM, muito à mercê de acordos delineados com agentes turísticos que conduzem ao estabelecimento o mesmo tipo de chineses continentais que se deleitam a enterrar os pés na esterca areia da praia de Hac Sa. Nada mau para quem, como Carson Sheung Ka Shing, ja foi o cabeleireiro-mor (o império do magnata começou com um salão de tratamento capilar em Kowloon) de Hong Kong.

terça-feira, julho 03, 2007

Foochow ou os Mil Nomes da China


Teria preferido Xiamen, ainda que as ressonâncias quase fantásticas da antiga Amoy praticamente já não persistam.
Calhou Fuzhou, cidade em que formigam seis milhões de pessoas, mais de metade da população portuguesa condensada no cinzentismo ascético e habitual das urbes chinesas. A Foochow do início do século XX, numa altura em que a China fervilhava mil descontentamentos, muitos dos quais singravam à custa da presença e do apetite rapáceo das nações ocidentais, teria sido o destino ideal.
A China das concessões estrangeiras, de Shameen, de Shangai, de Amoy, de Qingdao, de Porth Arthur, das shangai flowers (tal e qual Josephine Bakers do Oriente) e do ópio. A China dos escritos de Pearl S. Buck e de Sommerset Maugham. Uma vez mais, a China de Foochow, hoje feita Fuzhou. Uma China com mil séculos e com mil nomes. Rostos? Quantos terá no futuro?

Ocean's em Macau

Slots, mesas de jogo, tuxedos e o glamour pastiche dos casinos, uma referência relâmpago a Macau e alguns nomes familiares. O Belllagio, o MGM e o irmão mais velho do Wynn, em quase tudo igual a este que aqui temos (talvez um nada mais liberto), apanhado de relance, muito à pressa, num filme em que abundam negociatas, vendettas e fichas de jogo.
Uma trama pobre, confusa e pouco convincente enfeita o resto do ramalhete sem que se saiba ao certo quem são, afinal, os treze de Daniel Ocean. Treze duros que aparecem agora envelhecidos, menos elásticos e menos convincentes, dimínuidos por um enredo que repte os propósitos da aventura original e só lhes muda os preceitos e o vilão.
Uma trama monocórdica porque sem desvios:não há em todo o filme uma pitada de romance, uma diva que empanturre um pouco a ginastica à engrenagem e faça hesitar um nada ou um ou outro.
Ocean's Eleven, o único quinhão genuíno da trilogia (recriou, recorde-se, um clássico de 1960 em que brilhavam Frank Sinatra, Sammy Davis Jr., Dean Martin, Shirley MacLaine e uma série de outros nomes de alto gabarito) conseguiu ser um filme monumental: bons actores, uma boa trama, uma banda sonora genial.
Ocean's Twelve, se algum mérito teve, foi o de não deixar morrer a pandilha. Recuperou-a num cenário mais do que distinto, contra uma espécie de Arséne Lupin dos tempos modernos. Tirando uma ou outra excepção, nenhuma sequela se consegue alçar para além da notoriedade do primeiro respiro da saga. Ocean's Twelve é um daqueles filmes de digestão fácil, um dos que não enchem nem enjoam.
Com Ocean's Thirteen a coisa muda de figura. Ao perder a noção de que o enredo se desenvolve por caminhos já percorridos, Steven Soderbergh deita a perder o propósito da película.
Numa altura em que Vegas parece perder terreno face a Macau no que aos montantes movimentados diz respeito, parece que Hollywood quis dar um empurrãozinho à cidade do pecado.
Se bem que Las Vegas não seja, bem vistas as coisas, mais que o maior outdoor publicitário do mundo, há no filme uma sucessão de marcas e referências que fazem mais pela cidade norte-americana que aquilo que o mui amador e quase tautológico slogan que trata de promover Macau lá por fora - "Num mundo de diferença, a diferença é Macau"- alguma vez poderá fazer pelo território.